Um pacote de beiju, uma caneca vazia, uma caixa de remédios, uma Bíblia, um som Gradiente 3 em 1, um canivete, lápis e canetas, cadernos com anotações e muitos papéis espalhados disputam o espaço de uma mesa com um computador.
Essa mesa fica encostada numa janela que dá para a Serra da Tromba, onde o sol se põe queimando o horizonte e pintando a paisagem cinzenta da Gameleira, zona rural de Vitória da Conquista – a 512 km de Salvador.
É nela que Elomar Figueira Mello trabalha – ora compondo, ora desenhando, ora escrevendo. Quase sempre preso às atividades da fazenda Casa dos Carneiros, o menestrel completou 78 anos em dezembro último, cheio de projetos e com novidades a tirar da bruaca.
O mais recente foi o lançamento do seu segundo livro, ocorrido no final de março em Vitória da Conquista, A Era dos Grandes Equívocos, em edição limitada e independente. “É um cacete, é uma crítica violenta, porque lá tem um mundo de informações e opiniões, em termos técnico-científicos, político, econômico e espiritual”, antecipou o autor, em 2012.
Ao longo das suas 320 páginas, Elomar fala sobre assuntos polêmicos do século 20, como a falta de exatidão da matemática, a não lógica Aristotélica, a razão para estudar e a ideia de que caminhamos rumo às trevas – em processo de involução. Para isso, o escritor criou um gênero literário, o mão-de-prosa.
É como um ensaio, porém ambientado numa ficção, refletindo através do olhar de quatro personagens: um antropólogo, um poeta, um intelectual engajado e um andarilho. Em síntese, são questões do próprio Elomar. “Um livro para quem quer conhecer e entender o pensamento elomariano”, definiu a produtora do compositor e coordenadora editorial da obra, Rossane Nascimento. “Elomar quer dividir com os seus admiradores aquilo que ele acredita”, completa.
A obra começou a ser pensada após a reunião de velhos rascunhos de Elomar a escritos mais recentes. Passou a tomar corpo a partir de 2004, concluída cerca de oito anos depois. De lá até o lançamento, vinha sendo revisada e novos trechos inseridos. “A produção foi um trabalho muito árduo. Nós imaginávamos que seria rápido, houve conversas com grandes editores, mas sempre tinha uma coisa que segurava o livro na gaveta”, declara Nascimento.
Ao mesmo tempo em que é polêmica, a trama também é “cercada por uma aura poética no uso de metáforas que tecem belas imagens”, diz o texto da contracapa. “Elomar usa muito o dialeto, o vernáculo e o hipérbato e ainda é um neologista, cria muitas palavras”, acrescenta a revisora. “Se trata de uma obra muito densa, que contraria toda uma série de conceitos e conhecimentos”, resume.
Formado em Arquitetura pela Universidade Federal da Bahia, o autor da Ópera da Catingueira, nos apresenta e nos convida, em A Era dos Grandes Equívocos, a fazer uma imersão no seu pensamento filosófico. Uma das suas teses, já conhecida por seus cúmplices (e não fãs), é a de que o mal vem da cidade. “Elomar é um homem que vive no campo, ele cultiva a rotina e os fazeres do campo, se tem uma coisa que o deixa irritado é a cidade”, revela Rossane. Por isso vive praticamente isolado, consertando as cercas do chiqueiro dos bodes e desenhando novas partituras para futuros concertos.
Novos projetos
Mesmo estando à frente das atividades rurais, Elomar não para de compor e anda revirando os seus arquivos. Tem romances, óperas, poesias, textos para teatro e roteiros de filmes – finalizados e a finalizar, muita coisa ainda inédita para o seu público.
O fim da sua fase de cancioneiro já foi anunciado, será com o disco Riachão do Gado Brabo, com canções inéditas e participação do filho João Omar. Enquanto isso, realiza concertos pelo Brasil. A próxima apresentação será no dia 29 desse mês em Recife, no Teatro Guararapes, ao lado do amigo Vital Farias. Recentemente, Elomar anunciou a vontade de voltar com o projeto Cantoria, em que se apresenta ao lado dos amigos Geraldo Azevedo, Vital Farias e Xangai.
Outra novidade é que Elomar também irá relançar toda a sua discografia. “Os discos se esgotaram e não existe mais nada para comercializar”, diz a produtora.