O ex-ministro Geddel Vieira Lima (PMDB-BA), que ocupou a Secretaria de Governo do presidente Michel Temer (PMDB), foi preso pela Polícia Federal nesta segunda-feira na Bahia, em ação decorrente da Operação Cui Bono?, que investiga um esquema de corrupção na Caixa Econômica Federal. Geddel foi vice-presidente de Pessoa Jurídica da Caixa entre 2011 e 2013, período investigado pela Cui Bono?. A prisão foi determinada pelo juiz Vallisney de Souza Oliveira, da Justiça Federal de Brasília.
Segundo afirmou o Ministério Público Federal quando a operação foi deflagrada, o ex-ministro, o ex-deputado federal Eduardo Cunha e o operador financeiro Lúcio Bolonha Funaro desviaram “de forma reiterada recursos públicos a fim de beneficiarem a si mesmos, por meio do recebimento de vantagens ilícitas, e a empresas e empresários brasileiros, por meio da liberação de créditos e/ou investimentos autorizados pela Caixa Econômica Federal em favor desses particulares”.
A Operação Cui Bono? (“a quem interessa?”, em latim), que cumpriu mandados de busca e apreensão na casa de Geddel em Salvador, foi deflagrada a partir da Operação Catilinárias, de dezembro de 2015, que teve Cunha como alvo principal. Entre os documentos encontrados pela PF, aos quais VEJA teve acesso à época, estavam papéis com uma relação de empresas que pleiteavam empréstimos e financiamentos na Caixa, além de informações detalhadas sobre taxas de juros, prazos das transações e os valores de cada operação.
Uma folha, destacada com o título “Pipe Line Geddel” (o equivalente a “Duto Geddel”), faz referências a companhias como Eldorado, Flora, Vigor, Bertin e J&F, todas do Grupo J&F, que fechou uma explosiva delação premiada com a Procuradoria-Geral da República. Há ainda outro material, chamado de “Pendência Geddel”, que lista uma série de operações de crédito envolvendo a J&F, a Hypermarcas e a Gol.
Mensagens trocadas entre Eduardo Cunha e Geddel Vieira Lima reforçam os indícios de que os dois peemedebistas se aliaram para manipular empréstimos e investimentos liberados pela Caixa. Em 30 julho de 2012, por exemplo, Cunha e Geddel trataram de uma liberação de um financiamento da Marfrig. “Voto sai hj”, informa Geddel para Cunha. Um mês depois, a Marfrig, quando estava com a corda no pescoço e prestes a se desfazer de alguns negócios para quitar a sua dívida, fechou um empréstimo de 350 milhões de reais com a Caixa. Em outro caso, envolvendo a empresa de eletrônicos Digibras, o ex-ministro escreve para o ex-presidente da Câmara: “Já estou entrando no circuito”.
Depois de ser alvo da Cui Bono? e de virem à tona as delações premiadas dos executivos do Grupo J&F, Geddel Vieira Lima, com receio de ser preso, ofereceu ao Supremo Tribunal Federal (STF) seus sigilos fiscal e bancário e a entrega de seu passaporte.
“Malgrado esteja absolutamente convicto de inexistir lastro probatório que sustente qualquer investigação contra si, muito menos fundamento para a decretação de medidas cautelares, apenas por excesso de zelo, coloca à disposição dessa Suprema Corte o seu passaporte, que entregará se previamente intimado para tanto”, dizia o documento apresentado pela defesa de Geddel.
Na conversa gravada entre o empresário Joesley Batista e o presidente Michel Temer, em março, no Palácio do Jaburu, o delator disse ao peemedebista que costumava tratar dos assuntos de interesse da empresa no governo por meio de Geddel Vieira Lima. Como o ex-ministro passou a ser investigado, contudo, Joesley explicou que não poderia mais procurá-lo. Foi nesse contexto que Temer indicou a Joesley Batista como homem de sua “mais estrita confiança” o ex-assessor presidencial e ex-deputado federal Rodrigo Rocha Loures, flagrado um mês depois pela Polícia Federal após receber uma mala com 500.000 reais de um executivo da JBS.
Além de levarem Geddel a se movimentar para evitar a cadeia, as delações do Grupo J&F também fizeram com que o ex-ministro monitorasse de perto a disposição de Lúcio Funaro em aderir a um acordo de colaboração com a PGR. A defesa do operador financeiro mostrou ao STF, por meio de registros de ligação, que Geddel Vieira Lima fez 12 telefonemas ao celular de Raquel Aldejante Pitta, mulher de Funaro, a partir do dia 17 de maio, quando se revelou que executivos da empresa haviam fechado delação premiada e que o empresário Joesley gravara o diálogo secreto com Temer. Geddel é nomeado como “Carainho” nos registros das ligações.
Em depoimento à Polícia Federal, Lúcio Funaro declarou que “estranha alguns telefonemas que sua esposa tem recebido de Geddel Vieira Lima, no sentido de estar sondando qual seria o ânimo do declarante em relação a fazer um acordo de colaboração premiada”.
Derrubado por colega
Um dos homens-fortes do presidente Michel Temer, Geddel Vieira Lima deixou a Secretaria de Governo, responsável pela articulação política do Planalto, em novembro de 2016. Ele não resistiu à crise provocada pelas revelações do ex-ministro da Cultura Marcelo Calero, que revelou ter sido pressionado por Geddel e por Temer, além do ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, a liberar a construção de um edifício residencial em uma área tombada pelo patrimônio histórico em Salvador. O peemedebista é dono de um apartamento no empreendimento e seria prejudicado pelo embargo da obra. O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, que proibiu a obra, estava subordinado a Calero.
Depois de acusar a cúpula do governo de tentar pressioná-lo a liberar uma obra de interesse pessoal de Geddel Vieira Lima, Marcelo Calero entregou à Polícia Federal gravações das conversas que teve com Temer, Geddel e Padilha, além de dois auxiliares próximos do presidente.
Na carta de demissão entregue ao presidente, o ex-ministro afirmou que o sofrimento de seus familiares foi determinante para a decisão. “Avolumaram-se as críticas sobre mim. Em Salvador, vejo o sofrimento de meus familiares. Quem me conhece sabe ser esse o limite da dor que suporto. É hora de sair”, escreveu.