Explorando comercialmente o local há 20 anos, comerciante diz que não desocupa e tenta artifício jurídico para se apossar permanentemente do Clube.

Uma notícia no mínimo curiosa chegou à nossa redação e está sendo apurada pela equipe de reportagem no município de Boquira, para esclarecer a população. Trata-se de um imbróglio no mínimo inusitado, que envolve a Associação Cultural e Recreativa de Boquira, entidade filantrópica, que há décadas promove lazer, entretenimento e a integração, não somente dos associados, como também da população boquirense e visitantes, que reconhecem o Clube de Boquira, como referência em eventos festivos e culturais. A maioria absoluta dos adultos de hoje, possuem memórias de momentos inesquecíveis, tantas histórias de amor vividas, que se iniciaram em alguma noite marcante nos bailes de formatura, debutante, adoráveis réveillons, enfim, os esforços no sentido de resgate deste patrimônio da cidade, esbarra agora em um impasse jurídico, que, a princípio, está sendo promovido por cidadão que acredita possuir direito de posse do patrimônio físico e com isso provoca indignação nos demais sócios e moradores.

Antes de abordarmos a demanda que se desenha, faz-se necessário registrar que a Associação Cultural e Recreativa de Boquira (Clube de Boquira), nasceu no ano de 1983, o Clube da Piscina, mantido por funcionários da mineração, não incluía todos os setores sociais, daí um grupo de amigos, se reuniu com o intuito de edificar uma segunda agremiação local, que fosse capaz de congregar jovens, adultos, crianças, empresários, comerciantes, profissionais liberais e demais personalidades, para promoverem e instigarem o convívio social. A entidade se organizou em um segundo espaço recreativo na cidade, que possibilitou também a realização de outras manifestações com finalidades diversas, promovendo de certa forma, a sociabilização mais ampla. Vale registrar que, ambas as agremiações seguiram funcionando de forma distinta por um bom tempo.

A ideia produzia frutos para os diversos segmentos sociais, com destaque para os eventos realizados. Ocorre que, no ano de 1990, com o encerramento das atividades da mineração e o consequente esvaziamento do Clube da Piscina em decorrência das mudanças de diversas famílias, especialmente dos mineradores ali residentes, os associados da outra agremiação (ACRB 1), se reuniram e compraram o espaço físico com toda a estrutura do clube da mineração, passando a possuir duas sedes. Esse fato ganhou notoriedade, ampliando a entidade com a inclusão da ACRB 2. Mantidos através de contribuições dos sócios proprietários, que desfrutavam e se fortaleciam com a união de associativistas, o Clube tornou-se patrimônio da cidade. Como tudo na vida possui altos e baixos, com o tempo, uma série de fatores provocou o desaquecimento da economia local, que obrigou a diretoria e associados a deliberarem e aprovarem a desativação temporária do espaço ACRB 1, sem se desfazerem do imóvel, ficando acertado que permaneceria em funcionamento apenas a ACRB 2.

Preocupados em ajudar um dos sócios à época, e, ao mesmo tempo, decididos a não deixar o imóvel abandonado, no ano de 1998, todos os demais associados e diretoria, concederam ao senhor Joselito Mendes de Oliveira, a oportunidade de explorar comercialmente o bar e o restaurante do imóvel onde está localizado a ACRB 1. Constou-se em ata que tal autorização de uso obrigava o citado sócio, Senhor Joselito, a assumir despesas como água, energia elétrica, segurança, limpeza e conservação do imóvel, liberando-o dos custos com o aluguel, ou seja, concederam uma autorização de uso temporário.

Segundo apurou a reportagem, a intenção dos sócios proprietários e a direção da entidade à época, foi oferecer condições de trabalho ao Sr. Joselito, que, por sua vez, se comprometeu em zelar pelo imóvel pelo tempo que estivesse usufruindo do espaço. Assim foi acertado entre as partes, com a garantia da devolução da sede do clube, do qual ele (Joselito) também é sócio, quando este fosse solicitado. Ocorre que, passados 20 anos, já contando com uma nova diretoria, devidamente constituída pela maioria dos sócios, que através do atual presidente Evandro Rego Novais Filho, vem realizando uma verdadeira transformação, com projetos viáveis que adéquam a entidade para as necessidades atuais, após novas deliberações dos sócios, decidiu-se pela reativação do imóvel ACRB 1, que será utilizado de acordo com os objetivos da entidade. A surpresa e indignação, veio quando a diretoria convocou o então sócio e cuidador Sr. Joselito para que providenciasse a desocupação do imóvel, todos ficaram chocados com a recusa de forma intransigente.

Como se não bastasse, além de não aceitar nenhuma mediação, ao ser informado de que a demanda havia sido judicializada na forma de ação reivindicatória de propriedade, com pedido de imissão de posse, informações dão conta de que, o Sr. Joselito, constituiu a advogada Drª Heloisa Carla Santos da Cunha, que, segundo se apurou, foi também presidente do referido Clube por um ano. Apesar do curto período de tempo, esse período foi suficiente para que conhecesse as dificuldades da agremiação, ao ponto de, segundo informações, ser obrigada a  vender parte do terreno da ACRB 2, a fim de quitar obrigações trabalhistas do Clube. Nossa reportagem entrou em contato via telefone com a advogada, informando que os fatos seriam divulgados, oferecendo a esta a oportunidade para que se manifestasse sobre a demanda, cuja defesa é aparentemente patrocinada por ela. Atendendo a sua solicitação, encaminhamos inclusive um resumo das informações via mensagem de texto por aplicativo, no entanto, esgotado o tempo informado, não obtivemos retorno. Há ainda informações de que, nos autos, existe uma contestação acompanhada de reconvenção. Ou seja, baseando-se no Instituto usucapião, Joselito pede ao Magistrado responsável pelo processo, que lhe conceda a propriedade do imóvel do Clube, alegando que a Instituição abandonou o bem que pertence não a um ou dois sócios e sim a todos da agremiação.

De acordo com o advogado do Clube de Boquira, Dr. Guilherme Pasquariello, “trata-se de um descalabro, o indivíduo ter a torpeza de querer tomar para si um bem que não é seu. De acordo com as prova juntadas aos autos, o Clube busca atestar que, além de não preencher os requisitos para Usucapião urbano, que é a posse mansa e pacífica de imóvel de até 250M², o imóvel do Clube tem área de 2.612 M² e 11.900M², o Sr. Joselito possui casa própria e finge se esquecer que ocupou de favor o clube, contando com a solidariedade dos demais sócios por anos, sempre com a obrigação de devolver o imóvel aos seus legítimos donos”.

O advogado que defende o Clube foi enfático ao afirmar que “não há dúvidas de que a justiça será reestabelecida e tal situação análoga a que praticou Judas Iscariotes, será desmascarada nos Tribunais, uma vez que não há fundamento para a reconvenção proposta, pois o Art. 183 da Constituição Federal é claro a esse respeito: Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.” Ressalta ainda Dr. Guilherme Pasquarriello, que “o ex-sócio, em um dos raros diálogos com representantes da agremiação, afirmou que só desocuparia o imóvel, caso este fosse vendido e a ele (Joselito) repassado como forma de indenização, o pagamento de uma porcentagem estipulada pelo próprio, que gira em torno de 20 a 30% do valor total da venda”.

O Atual Presidente da Associação Cultural e Recreativa de Boquira (Clube de Boquira), Sr. Evandro Rego Novais Filho, se mostra indignado com esta demanda e com a lentidão da Justiça, que desde o ano de 2018, não se manifesta no sentido de uma decisão. “Isso é péssimo para a agremiação, que confia na Justiça, mas, está sofrendo graves consequências com a falta de celeridade e uma sentença definitiva para o caso. Em razão desse litígio, restam prejudicados os sócios e a própria sociedade que já poderia estar desfrutando das melhorias a serem realizadas. Devido a esse imbróglio, o Clube Social passa por dificuldades, sendo obrigado a demitir funcionários em face de uma ação desprezível de alguém que quer se apropriar do que não é seu por direito”. Desabafou Evandro relembrando a memorável frase de Rui Barbosa: “Justiça Tardia não é justiça”.

Nossa reportagem procurou também o senhor Joselito Mendes de Oliveira, para que ele se manifestasse sobre essa demanda que passa a incomodar a sociedade boquirense, sendo motivo de clamor social. Sócios e moradores comentam o fato e desejam uma solução do caso pelo bem da Agremiação tão estimada. No entanto, não conseguimos localiza-lo até o fechamento desta matéria. Mesmo assim, obedecendo ao que determina a ética jornalística e ao direito de contraditório, deixamos aberto o espaço, para que querendo, ele faça as considerações que julgar necessárias, apresentando a sua versão dos fatos aqui abordados.