Decisão da Anvisa sobre Sputnik V se opõe a especialistas e gestores “Vacina é segura e segue sendo aplicada em milhões de pessoas em 62 países do mundo” Diz Flávio Dino.
A decisão da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) de não autorizar a importação da vacina russa Sputnik V tem sido criticada por especialistas e levou governadores a buscarem alternativas para obter o aval do órgão regulador. Nesta terça-feira, 27, governadores do Nordeste e Norte participaram de uma reunião com o Fundo Soberano russo.
O governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), informou que serão fornecidos mais relatórios e documentos técnicos para tentar a revisão administrativa ou judicial da decisão da Anvisa. “Nós, os governadores das regiões Nordeste e Norte, que compramos juntos pelos estados a vacina Sputnik, tivemos uma agenda com cientistas da Gamaleya [instituto russo responsável pela vacina] e do Ministério da Saúde da Rússia. Afirmaram com muita segurança que é uma vacina segura, com baixos efeitos colaterais, nenhum grave; que é uma vacina eficaz, com capacidade de imunização, já aplicada em milhões de pessoas em 62 países do mundo. Assim, esperamos que eles possam responder tecnicamente aos pontos apresentados no relatório da Anvisa, que diz exatamente o contrário. Precisamos saber quem está com a verdade”, afirmou o governador do Piauí, Wellington Dias (PT).
Crítico habitual da ação da Anvisa durante a pandemia, o governador Rui Costa participou da reunião, mas ainda não se manifestou desde a análise da agência. Três gerências técnicas da Anvisa (medicamentos, fiscalização e monitoramento) deram pareceres contra a importação do imunizante. O órgão afirmou que não recebeu relatório técnico capaz de comprovar que a vacina atende a padrões de qualidade e não conseguiu localizar o documento com autoridades de países nos quais o imunizante é aplicado.
Para o médico Carlos Brites, professor da Universidade Federal da Bahia, a decisão da Anvisa “foi acertada”. “Desde o início faltam dados sobre segurança, dados transparentes sobre como os estudos foram feitos. Na realidade, o único estudo publicado foi numa população exclusivamente russa e com lacunas importantes. Acho que a Anvisa agiu corretamente, já que essa é uma regra básica para a aprovação. Todas as outras vacinas fornecem esses dados. Não é o fato de outros países utilizarem [a Sputnik] que dá aval para o uso”, disse.
Já o secretário de Saúde da Bahia, Fábio Vilas-Boas, afirmou que a Anvisa está “desconectada” da realidade. “A simples ida de técnicos da Anvisa a Moscou não iria resolver a infinidade de documentos que eles solicitaram. A nossa equipe prevê em torno de seis meses o tempo para responder a quantidade de questionamentos. Existe uma desconexão da realidade em que vivemos com a exigência que a Anvisa está propondo”, declarou, em entrevista à TV Bahia.
Ainda segundo o titular da Sesab, a avaliação da agência é “um desfile de tecnicalidades”. “A decisão não provê informações de riscos e faz alusão a potenciais riscos que não estão sendo confirmados na prática. Na Argentina, a Sputnik V é a vacina principal e não estamos vendo os hermanos morrerem ou virarem jacaré”, completou.
Procurada, a Secretaria de Saúde do Estado não analisou o posicionamento da Anvisa. “Se não houver uma manifestação do STF, é possível que governadores façam essa provocação, o que entraria no território da judicialização. Caso o STF entenda que a Anvisa foi clara em provar que há evidencias suficientes para que não seja feita a importação, a decisão estará tomada e a vacina não será entregue. Pelo menos não até que não haja nova decisão por parte da Agência reguladora”, disse a pasta, por meio de nota.
Um dia depois da Anvisa barrar a entrada da Sputnik no Brasil, o gerente-geral de Medicamentos e Produtos Biológicos da agência, Gustavo Mendes, declarou que ainda há espaço para liberar a importação do imunizante. Segundo Mendes, o órgão regulador pode rever o posicionamento se tiver acesso às informações técnicas que considera ausentes. “Os pedidos de importação excepcional, os que não definimos ontem, estão em aberto e também o pedido para autorização para uso emergencial. Então, existe espaço para a entrada [da vacina]. As portas não estão fechadas. Além disso, toda as decisões da Anvisa são passíveis de recurso”, afirmou o gerente, em audiência na Câmara dos Deputados.