Com cerca de 30% dos municípios sofrendo sequestros de recursos em plena pandemia, a situação se agrava e pode inviabilizar gestões em seis meses, caso não haja um parcelamento especial.
Cerca de 30% das prefeituras dos municípios do estado sofrem com dificuldades em saldar dívidas previdenciárias. Com a pandemia da Covid-19, as coisas ficaram ainda piores, e muitas gestões municipais se viram em um cenário em que o pagamento das despesas contraídas tornou-se problema expressivo. A situação chegou a um nível tal que, de acordo com a União dos Municípios da Bahia (UPB), se nada for feito, os municípios enfrentarão o colapso administrativo em seis meses.
Em busca de evitar uma provável e esperada ruína fiscal, existe um movimento a fim de sensibilizar autoridades políticas, estaduais e nacionais, a respeito do problema. Segundo o presidente da UPB, Zé Cocá, os municípios vivem um caos administrativo com receitas que não cobrem as responsabilidades impostas pela legislação vigente. A UPB, que é representada, nacionalmente, pela Confederação Nacional de Municípios (CNM), defende que o Congresso Nacional se debruce sobre o tema e amplie a base da arrecadação municipal.
“A dívida previdenciária é um problema crônico dos municípios, e agora chegamos a um ponto crítico, ao nível de entrar em colapso. Todo início de gestão [municipal], havia um parcelamento da dívida, que ia se tornando uma bola de neve. Desta vez, por conta da pandemia, os municípios não conseguiram pagar ao INSS Patronal. Com isso acumulou o débito e veio tudo junto no início do ano”, afirmou Cocá. “30% dos municípios já estão em situação crítica”, com o sequestro de recursos para pagamento da dívida previdenciária. “Se não houver o parcelamento especial [da dívida previdenciária] para ontem, esses municípios podem não conseguir honrar suas folhas de pagamento. Isso é um problema gravíssimo. Peço a Deus que o governo federal se sensibilize e libere esse parcelamento”, frisou Cocá.
O pagamento referente ao INSS deve ser feito pelos municípios até o dia 20 de cada mês. No entanto, diante das dificuldades financeiras, avultadas pela pandemia do novo coronavírus, tem se tornado cada vez mais comum o atraso no cumprimento dos compromissos firmados. “O município, ao não recolher as contribuições previdenciárias no prazo, abre margem para que a União, por meio da Receita Federal do Brasil, efetue sequestros no FPM [Fundo de Participação Municipal] do Município, em alguns casos zerando a cota recebida. Quando isso acontece, passa-se a utilizar a receita do mês seguinte para quitar obrigações do mês anterior”, destaca o advogado previdenciário Jaime Cruz.
“O problema é que basta que isso aconteça em um único mês para que se repita nos seguintes, promovendo verdadeiro descompasso na organização financeira e fiscal do município. E, para agravar ainda mais essa situação, esses descontos vêm sempre acompanhados da retenção de valores referentes a juros e multas decorrentes do atraso no recolhimento”, alerta o advogado. Os municípios pedem a prorrogação da dívida previdenciária, contraída até 31/12/20, por 240 meses junto ao INSS. “Nós já pautamos os presidentes das entidades e esse já foi um passo importante. Já discutimos com os deputados federais da Bahia e pedimos a todos os presidentes das associações [municipalistas] que façam essa discussão com os deputados e senadores. Esperamos que ele leve isso para o presidente da República”, disse Cocá.
Renúncia – A redução da alíquota do INSS, bandeira defendida tanto pela UPB quanto pela CNM, precisa passar, necessariamente, pelo governo federal, por envolver renúncia de receita federal. Entidades representativas e gestores esperam sensibilizar os parlamentares para as pautas dos municípios com relação ao problema. “É uma questão de sobrevivência. Ou o Congresso Nacional, a União, o ministro da Economia entendem que é uma questão de sobrevivência dos municípios de pequeno porte ou vai ter um verdadeiro colapso nas cidades. Há prefeitos desesperados. É uma situação que se agravou com os parcelamentos que foram feitos nesses últimos 24 anos, o que inviabilizou qualquer boa gestão dos recursos”, disse o presidente da Federação dos Consórcios da Bahia (Fecbahia) e prefeito de Andaraí, Wilson Cardoso (PSB).
“Nesse momento de crise, estamos priorizando a folha de pagamento dos servidores, e já tem sido complicado honrar esse compromisso. Suspendemos grande parte das nossas ações, como obras, algumas que estavam com o início já previsto para esse ano, e seguimos apenas fazendo as manutenções emergenciais e as ações de saúde. A receita própria do município é basicamente proveniente do IPTU, e se nos anos anteriores tínhamos uma média de 30% de inadimplência, no último ano esse índice subiu para 70%, com a pandemia”, avalia o prefeito do município de Santana, Marcão Cardoso (PP).
“Além disso, o município está com muita dificuldade em renegociar seu débito previdenciário, uma vez que não há, hoje, nenhuma modalidade de parcelamento que favoreça os municípios na renegociação dessa dívida. Na situação atual, ou o município paga os encargos da folha (INSS), ou paga a própria folha (o salário dos servidores). E estamos escolhendo a segunda opção. A pandemia só veio agravar uma situação que para a grande maioria dos pequenos municípios, como Santana, já era muito difícil”, completou Marcão.
“A solução do problema do recolhimento do INSS é crucial para assegurar a sobrevivência dos municípios. Com a alíquota patronal, hoje, em torno de 22%, os municípios estão sendo sufocados e não vão conseguir sobreviver com isso. Se não tiver mudança, a gente está vendo que vai ter fechamento de prefeituras do interior porque não vai ter dinheiro para pagar as contas”. “O enfrentamento da pandemia nos trouxe novas despesas, novos desafios, e um grande problema que os municípios vão enfrentar no futuro é a empregabilidade. Os municípios tendem a melhorar a cada dia que passa essa sua gestão com a coisa pública, principalmente sua relação entre a população e o serviço que você consegue oferecer, e o que você tem de arrecadação, precisamos ajustar essa situação”, completou.
Articulação busca evitar colapso – Entre as principais demandas expostas em uma carta aberta, está a aprovação da (PEC) 391/2017, que amplia em 1% o Fundo de Participação dos Municípios (FPM); a abertura de um debate sobre a redução da alíquota da previdência para os municípios, dos atuais 22,5% para a ordem de 10%; além da limitação das parcelas pagas por dívidas previdenciárias em 1% da receita corrente líquida mensal do município.
“Cabe à gente também apoiar a CNM para mobilizar os deputados e senadores. Precisamos integrar o movimento porque, junto aos parlamentares, nós nas regionais temos mais poder de articulação”, defendeu. “Os municípios não podem se comparar, as arrecadações são diferenciadas e estamos preocupados com essa queda. Não temos mais condições de esperar”. Foi criado um grupo de trabalho para discutir essas pautas com a CNM.