Maria e Cecília, de três e dois anos, são as filhas da Analista Judiciária do TJBA, Elyana Pereira Matos
Neste domingo (13), dia no qual será comemorado mais um tradicional Dia das Mães, Elyana Pereira Matos, servidora do Tribunal de Justiça da Bahia há 12 anos, irá celebrar o dia ao lado das suas meninas, Maria e Cecília, de três e dois anos, respectivamente. “A maternidade sempre tocou o meu coração. Eu sempre tive a intuição de que seria mãe”, revela emocionada.
Formada em Direito, ela atua como Analista Judiciária no Gabinete da Desembargadora Maria do Socorro Barreto Santiago, e além das atividades maternas também acumula a função de tesoureira da Associação aBRAÇO as Famílias com Crianças Portadoras de Microcefalia e Outras Malformações Congênitas. A organização consiste em uma rede de amparo formada por mães e profissionais de saúde, com o intuito de fortalecer e ampliar o cuidado às crianças com microcefalia e seus familiares.
Elyana conta que teve um aborto involuntário em sua primeira gestação, mas, logo na sequência ficou grávida de Maria, que veio ao mundo em 2014 e completará quatro anos no próximo mês de junho. “Pra mim, receber Maria foi a concretização de um sonho. Um presente realmente divino, e acho que a maternidade está muito relacionada ao divino, com o amor pleno, um amor maior e grandioso”, afirma. Elyana descreve a primogênita como uma criança “dinâmica”, “independente”, “alegre”, “interativa” responsável por ensiná-la o real significado do “Amor de Mãe”.
Logo após o nascimento de Maria, quando a pequena tinha 10 meses, Elyana decidiu que era o momento apropriado de aumentar ainda mais a família. Foi quando a Analista Judiciária engravidou de Cecília, hoje com dois anos e quatro meses. “Eu ainda amamentava Maria quando estava gestando Cecília. Eu estava vivendo para a maternidade naquele momento”, conta. Ela acrescenta que descobriu sua segunda gravidez no começo de maio de 2015.
Zika Vírus
No mesmo período, o Brasil havia registrado o primeiro caso de Zika vírus em solo nacional. No final de abril daquele ano, um teste preliminar do Instituto de Ciências da Saúde da Universidade Federal da Bahia (Ufba) identificou a presença do agente infeccioso no material biológico de alguns pacientes. Nos meses seguintes, a doença caracterizada por um quadro de febre leve, conjuntivite, erupção cutânea e dores nas articulações, tomaria proporções e desdobramentos inimagináveis. Era o início de uma epidemia que marcaria profundamente toda uma geração. E foi nesse contexto que, com 11 semanas de gestação, Elyana adquiriu a Zika, no começo de junho.
“Naquela época ninguém sabia das consequências do vírus da Zika para a gestação, era algo completamente desconhecido”, ressalta. Ela enfatiza que na semana seguinte, ao completar 12 semanas, realizou o primeiro ultrassom morfológico e que o exame não apontou qualquer alteração. Na ocasião, o médico ultrassonografista, a obstetra e a pediatra de Maria tranquilizaram Eliana, esclarecendo que o Zika não oferecia nenhum risco à gravidez, e orientaram que ela se medicasse apenas se sentisse uma coceira muito intensa. “Eu só tomei um comprimido, porque não gostava de tomar remédio grávida. Os sintomas do Zika em mim duraram mais ou menos 48 horas”, explica.
Contudo, o quadro foi dramaticamente revertido a partir da segunda ultrassom morfológica, realizada na 20ª semana de gestação, em agosto daquele ano. Durante a realização do exame o médico não verificou o corpo caloso – estrutura que conecta os hemisférios direito e esquerdo do cérebro do bebê – e percebeu um aumento nos ventrículos cerebrais, que consiste em estruturas presentes em ambos os hemisférios.
A primeira reação
“Eu sentei na maca e comecei a chorar, meu corpo inteiro tremia. No ano anterior eu tinha tido uma gestação, e o parto de uma filha completamente sem intercorrências. Eu não havia feito nada diferente [em relação a gestação anterior]”, rememora. No primeiro momento, o médico explicou que as alterações poderiam indicar uma síndrome relacionada à genética, e que a ausência do corpo caloso e o aumento nos ventrículos poderiam estar relacionadas a mais de 90 tipos de síndromes.
O profissional também apontou a possibilidade da realização de uma Amniocentese, exame que consiste na retirada de uma amostra do líquido amniótico para análise e posterior diagnóstico da síndrome ainda durante a gestação. Contudo, Elyana e o marido, Admilson Matos, optaram por não realizar o procedimento. “Meu esposo falou ‘Não, não importa. Não precisamos saber qual é a síndrome. Da maneira que Cecília vier, ela será bem-vinda, bem recebida e será esperada. Está tudo certo’”, relata.
Elyana conta que saiu do consultório abalada, e passou duas noites em claro, pensando em como a segunda filha nasceria, em quais as dificuldades que teria, que tipos de necessidades ela demandaria. “Eu imaginava minha outra filha com ela. Eu imaginava o risco de vida dela nascer com muita sequela. Ela nem tinha chegado e eu já tinha medo de perdê-la”, relembra.
Adepta à doutrina espírita, a Analista Judiciária foi ao centro que frequenta em busca de conforto. Chegando ao local, a palestra do dia falava sobre filhos especiais. Era agosto, Mês da Família, e todas as conversações daquele período estavam de alguma maneira relacionado à temática. Elyana explica que interpretou aquilo como algo muito além de uma mera coincidência, mas como uma manifestação de “organização celestial”.
“As pessoas que conversaram comigo me lembraram que ninguém nasce sem planejamento. Essa é a minha crença. Nenhum filho vem sem ser planejado por Deus. Ninguém recebe um filho de uma forma que não tenha condições de ampará-lo no amor, no cuidado e no auxílio maternal ou paternal”, opina. A mensagem de perseverança, amor e força deu a Elyana a tranquilidade, aceitação e compreensão necessárias para enfrentar os desafios de sua segunda maternidade, independente de quais fossem.
Microcefalia
A partir do segundo ultrassom, a realização do procedimento passou a ser mais frequente por ordens médicas. Na época, os médicos ainda não relacionavam a microcefalia, malformação congênita caracterizada pela redução do perímetro cefálico de seus portadores, ao vírus da Zika. A relação entre o vírus e o surto de microcefalia no País, em especial na região Nordeste, só veio a ser confirmada pelo Ministério da Saúde no final de novembro daquele ano, dias antes do nascimento de Cecília. A criança teve o diagnóstico para a condição neurológica em outubro, quando foi constatado que o valor do perímetro cefálico era abaixo do esperado pelo referencial da Organização Mundial de Saúde (OMS).
“Com muita fé e amor, eu consegui manter a minha gravidez completamente feliz. Acabei me vendo muito mais forte do que me via. Consegui fazer tudo que eu havia feito na gestação anterior: viajei, tirei fotos, fiz um book lindo para Cecília, assim como o de Maria, continuei trabalhando”, comemora. Ela também afirma que o apoio do marido e de toda a família foi fundamental neste processo, e continua sendo muito importante para conciliar a jornada dupla de mãe e Assessora Jurídica.
Rotina
Ela descreve a rotina profissional como “puxada”, e salienta a necessidade de estar sempre atenta para dar conta da produtividade, sem deixar de lado a excelência de um assessoramento bem feito, atualizado e responsável. “Há muitas mães lotadas no mesmo gabinete que eu fico, com filhos na mesma idade das minhas filhas. A rotina de qualquer mãe quando ela trabalha muda. Quando chega em casa tem o terceiro turno mesmo”, avalia. O amor até pode ser um trabalho em tempo integral, mas conciliar esta jornada dupla requer de Elyana e de seus familiares uma organização essencialmente ajustada.
A primogênita, Maria, é matriculada em uma escola em tempo integral desde que completou seis meses. Já a rotina de Cecília requer uma maior organização para atender a uma demanda que inclui sessões de fisioterapia, fonoaudiologia, hidroterapia, equoterapia, terapia ocupacional etc. Estas atividades oferecem os estímulos necessários ao desenvolvimento da pequena, além daqueles vindos das brincadeiras e interações dentro de casa.
Os horários desta rotina são divididos com o marido e pai de Cecília, de uma maneira que ambos possam participar da rotina da menina e não prejudicarem suas atividades profissionais. “Lá em casa não existe tarefa só de mãe ou tarefa só de pai. Tudo é tarefa de mãe e pai”, afirma. Ela também destaca o apoio de Julia Almeida, a quem descreve como “um misto de irmã e segunda mãe”. Júlia ajudou os pais de Elyana, Sônia e Fugêncio, a criá-la, e mudou do município de Mucugê, Oeste do Estado, para a Salvador em 2017 com o intuito de auxiliar o casal nesta rotina.
aBRAÇO a Microcefalia
Quando o médico de Elyana, responsável pela realização dos exames de ultrassom, percebeu o aumento de gestantes com bebês que apresentavam o perímetro cefálico reduzido, decidiu reunir as mães que faziam parte deste fenômeno em um mesmo grupo do aplicativo de mensagens WhatsApp. A ferramenta servia para promover a troca de experiências e informações entre estas mulheres e serviu de faísca para o que mais tarde viria a ser a Associação aBRAÇO.
No mesmo dia e lugar no qual Cecília nasceu, Joana Passos, uma outra mãe que também fazia parte do grupo, entrou em trabalho de parto. Desta maneira, na mesma maternidade na qual ambas entraram em trabalho de parto, Elyana e Joana, atual Presidente da “aBRAÇO a Microcefalia”, se encontraram pessoalmente pela primeira vez. Após meses de contato intenso via mensagem, a Analista Judiciária recebeu um convite de Joana para promover a arrecadação de fraldas, lenços umedecidos, leite em pó e outros materiais que seriam entregues a mães de crianças portadoras de microcefalia.
“Joana me ligou dizendo que havia visitado alguns hospitais e tinha visto que o problema era de saúde pública. De que nós estávamos dentro do problema, e que as pessoas que ela havia visto tinham uma carência material muito grande”, recorda. Na época, Joana havia organizado um encontro para realizar a entrega dos donativos. Elyana conta que não só aceitou o desafio, como encontrou o apoio de muitos amigos, colegas de trabalho e familiares para encher sua casa de doações.
Em abril de 2016, oito mães receberam o material arrecadado por Elyana, Joana e Mila Mendonça, outra mãe que também participou da empreitada e atualmente ocupa o posto de Vice-Presidente da aBRAÇO. A Assessora Jurídica conta que a ocasião foi marcada pela troca de experiências, e também contou com as palestras de uma neuropediatra e do médico que havia meses atrás criado o grupo de WhatsApp que uniu Elyana, Joana e outras mães.
“Foi tão bom, tão acolhedor, tão gratificante para o coração de todos ali presentes, que nós marcamos uma segunda reunião na semana seguinte”, afirma. Em novembro de 2016, após a consolidação de encontros, que se repetiam sempre as quintas-feiras, a Associação aBRAÇO ganhou sua personalidade jurídica. Desde então, a organização, que também conta com o apoio de profissionais da área de saúde, consegue assistir parte das 260 famílias acompanhadas pelo projeto.
Contribuições
A Associação busca minimizar a carência de políticas públicas de amparo e estímulo aos portadores de doenças como a Microcefalia, e que também acaba atingindo os portadores de Síndrome de Down, Paralisia Cerebral e outras enfermidades. “Quando o estado falha, a sociedade civil entra. Nós não vamos estar dentro do problema e só ficar olhando. Foi assim que aBRAÇO foi intensificando o pedido de doações e fazendo campanhas”, explica.
Ela cita a iniciativa aBRAÇO Musical, que arrecadou cerca de nove mil reais em sua primeira edição, viabilizando a construção de uma sala multissetorial para seus associados. O espaço oferece atendimento três vezes por semana de fonoaudiologia, terapia ocupacional e fisioterapia duas vezes por semana. Além disso, o projeto também oferece atendimentos em nutrição e em epilepsia refratária, uma vez por semana.
O serviço é voltado para crianças que permaneciam na lista de espera para atendimento através do Estado sem conseguir encontrar atendimento de qualquer tipo. Cerca de 35 crianças participam de cada uma destas atividades. Uma segunda edição do aBRAÇO Musical possibilizou a aquisição e distribuição de aproximadamente 50 pares órteses, aparelhos ortopédicos utilizados para suprir ou corrigir a alteração morfológica de um órgão, membro ou segmento de um membro, assim como a deficiência de uma função.
Uma pareceria firmada com a Rede Fluir, especializada em atividades aquáticas e Pilates, oferece quatro turmas semanais de hidroterapia, sem custos para as crianças associadas. Além disso, as crianças têm vantagens na lista de espera para o serviço de equoterapia filantrópica oferecida pela Associação Baiana de Equoterapia (ABAE). “Queremos fazer mais, queremos fazer para todo mundo, para que a gente também deixe de ter lista de espera”, almeja.
Feira de Serviços
O aBRAÇO marcou presença na última edição da Feira de Serviços do Tribunal de Justiça da Bahia, em comemoração ao Dia das Mães, que chegou ao fim na sexta-feira (11). Na ocasião, a associação montou um stand onde foram comercializados camisas, canecas, copos e outros produtos associados. Todo o valor arrecadado com as vendas são revertidos para as ações do projeto. “É através das doações e vendas dos nossos produtos que conseguimos arrecadar recursos. Doar é muito importante. É com esse dinheiro que pagamos a fonoaudióloga, a terapeuta ocupacional, a fisioterapeuta e a nutricionista”, enfatiza.
Elyana acrescenta que existem outras formas de colaborar com a Associação, como depósito direto na conta bancária, pelo PayPal, além de doações de leite e itens de higiene. “É algo muito importante pois as famílias muitas vezes sobrevivem com um BPC (Benefício da Prestação Continuada), no valor de um salário mínimo, o que é muito pouco”, conclui.
Colabore com o aBRAÇO:
Caixa Econômica:
Banco 104, Agência 3843, OP 003, CC 479-7.
O CNPJ da instituição é 27.034.649/0001-80.
PayPal: clique aqui para mais informações
Doações: fraldas no tamanho GG, leite, lenços umedecidos, sabonetes, cotonetes e algodão, entre outros materiais de higiene.
*Os itens compõem Kits que são mensalmente distribuídos a aproximadamente 90 famílias assistidas pelo projeto
Mais informações: contato@abracoamicrocefalia.com.br // (71)99630-7875
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Fonte: ASCOM -TJBA