Vivemos em sociedade e em razão disso sempre nos curvamos e nos rendemos aos hábitos e costumes do grupamento que compomos, os quais estão tão arraigados na estrutura social que muito dificilmente dele nos livramos. Vivemos sempre atendendo a esses "apelos" sociais, sem nos darmos conta de os avaliarmos detidamente, objetivando entender se procede ou não se comportar desse ou daquele jeito; se está correto ou não aquela forma de agir, enfim.
Alguns desses hábitos e costumes têm nos inquietado, considerando a forma com a qual eles se dão. Um deles diz respeito ao rito dos velórios nas pequenas cidades, onde a maioria das pessoas se conhece. Temos acompanhado alguns – ainda que de longe – e percebemos a angústia e a aflição da família enlutada, já que quase não pode sentir a dor da separação e seus últimos momentos – como deveria -, considerando o fato de ter que providenciar a "recepção" dos conterrâneos amigos, os quais inevitavelmente desejam ver e dar o último adeus ao companheiro que se foi.
Aliado à dor, a família "precisa" prover a casa do necessário para recepcionar os que chegarão. A situação está tão inquietante que em algumas cidades já são oferecidos serviços de "bufê" no velório, com direito a chocolate quente e tudo o mais! Ora… é festa? Se não tomarmos cuidado, os momentos de velório serão tão estilizados que seus custos ultrapassarão o preço de uma festa de debutante, por exemplo! Ruas são fechadas, toldos são montados e, dependendo do bufê contratado, até as cadeiras são forradas! Aí, nos perguntamos: e a família enlutada, como fica com tudo isso? Não pode mesmo sequer sentir a dor do ente querido que se foi! Não pode sentir até mesmo o silêncio que nos leva à reflexão e nos faz trazer à lembrança momentos mágicos que com ele vivemos! Numa ocasião, conversamos com um amigo que nos contou que quando o seu genitor morreu a família de imediato providenciou matar um garrote, a fim de atender às expectativas dos amigos e vizinhos visitantes! Café, bolo, biscoitos e tudo o mais foi providenciado! Ao que parece, a maior preocupação termina por ser a "recepção" e não a dor da separação!
São situações que temos nos permitido e vivenciado por causa dos hábitos e dos costumes da nossa sociedade. Desta forma, pensamos na necessidade de revermos algumas das nossas posturas, por mais difícil que possa parecer, de modo que o grande protagonista de um velório não seja a "recepção" ou o "bufê", mas o sentimento da família enlutada, que necessita ainda da "presença" do Ser "ausente"!
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* Irlando Lino Magalhães Oliveira é Oficial da Polícia Militar da Bahia, no posto de Major do QOPM, atual Comandante da 46ª CIPM/Livramento de Nossa Senhora, e Especialista em Gestão da Segurança Pública e Direitos Humanos.